FOLHA
IMPERIAL
de
Ataide
Tartari
* * *
Devia ser umas onze horas da noite,
ou até mais tarde do que isso, quando o figura arrombou a porta da redação e
entrou xingando todo mundo. Quer dizer, na verdade ele não arrombou nada. E nem
conseguiria; o cara não é mais forte do que um pardalzinho com fome. Quem
entrou chutando tudo foi o seu guarda-costas. Agora que ele tinha conseguido o
título de barão, Barão do Dona Marta, ele só andava com guarda-costas. Para a
nobreza carioca, ter um guarda-costas era tão importante quando o título em si,
era uma espécie de complemento indispensável. O que não deixa de ser um bom
negócio para os guarda-costas.
Mas esse barão, não se sabe
exatamente por quê, estava
irado com um dos mais novos talentos
jornalísticos a serviço de Sua Majestade Imperial, o repórter Ronaldo Cetro.
Cetro tinha escrito, é verdade, um artigo sobre a outorga do título ao Barão do
Dona Marta devido aos serviços por ele prestados ao Império por ocasião da
visita do pop star plebeu Michael Jackson. O Barão cedeu sua casa no morro Dona
Marta, aquela favela, como camarim para o astro plebeu. Em vista disso, o
título lhe foi outorgado às pressas para evitar que o astro plebeu fosse
hospedado por um favelado igualmente plebeu. Agora ele era favelado, sim, mas
não obstante um membro da nobreza imperial brasileira!
Era natural, portanto, que a Folha
Imperial, um jornal
sempre a serviço de Sua Majestade
Imperial, colocasse o novo barão na primeira página, deixando o visitante
estrangeiro, um plebeu, na página interna. A manchete, é claro, era tipicamente
Folha Imperial, exaltando o talento que preenche todas as suas páginas:
NOBREZA FAVELADA:
NOVO BARÃO QUER O SEU EM CACHAÇA
E, abaixo dessa manchete, cobrindo a
outra metade da página, uma foto do novo barão segurando o título de nobreza
impresso em letras góticas com uma das mãos e um copo de cachaça com a outra. A
legenda da foto dizia: "Posso trocar esse troço por um vale-cachaça?"
Obviamente o barão, na sua nobre
ignorância, não sabia
apreciar o verdadeiro talento
jornalístico. Ao invés de
ficar grato por sua recém-adquirida
notoriedade, o barão
preferiu investir contra Cetro e a
Folha Imperial.
A bem da verdade, Cetro não ficou
sabendo de todos os
detalhes do que aconteceu naquela
noite na redação da Folha, mesmo porque nesta mesma hora ele estava passando
mais uma noite em frente ao Paço Imperial. Um dos camelôs que ocupam esta praça
durante o dia tinha cedido as instalações de sua barraca para Cetro passar a
noite na vigília.
Desde que Sua Alteza Imperial
Príncipe do Grão-Pará,
herdeiro do trono, tinha retornado
ao Paço Imperial no Rio
de Janeiro após alguns meses de
descanso no Palácio Imperial de Petrópolis, vários jornalistas faziam plantão
em frente ao Paço, tentando flagrar o príncipe saindo para mais uma de suas
grandes noitadas. Já era a quarta noite seguida que Cetro e Dida, o fotógrafo,
passavam sentados atrás da droga da barraquinha do camelô.
Quando deu meia noite o fotógrafo já
não aguentava
mais: -- Mas que porra, Cetro! O
Joãozinho não vai sair mais hoje. Eu acho melhor a gente ir dormir em casa, só
pra
variar um pouco.
-- Tu tá duvidando? Boêmio que é
boêmio não aguenta
passar quatro noites seguidas em
casa.
Sentado num banquinho e com uma
cópia da agenda
imperial na frente, Dida apontou pra
página que descrevia o
dia de Sua Alteza:
-- Olha aqui. O Joãozinho não vai
inaugurar nenhuma casa nova do Ricardo Amaral hoje. A agenda dele terminou às
oito da noite e ele voltou pro Paço. Eu não acredito muito nessa coisa de fugir
escondido. Ele não é invisível e ele sabe disso. Quando ele tem compromisso à
noite ele aproveita pra dar uma esticada, mas quando não tem ele não pode fazer
nada porque tá todo mundo de olho nele.
-- Cala a boca e olha pr'aquela
janela lá -- disse
Cetro, apontando pro Paço.
Dida olhou pela teleobjetiva da
máquina: -- Num tô
vendo ninguém.
-- Mas a cortina abriu...Se liga.
Fica com o dedo no
botão.
De repente Cetro viu um vulto
passando pela janela.
Dida clicou. Ele não usava flash à
noite, só filme sensível.
-- Quem era? -- Cetro perguntou.
-- A Terezinha; acho.
Cetro pegou a agenda imperial para
ver se a Terezinha,
Sua Majestade Imperial d. Maria
Teresa I, Imperatriz do
Brasil, estava mesmo no Paço. Ele
tinha certeza de que o
príncipe herdeiro estava, mas não a
atual chefe de Estado.
-- Não, Dida, não pode ser ela. Ela
tá junto com o
Visconde de Higienópolis e o Duque
de Pinel numa festa na
embaixada britânica. Ela e o corno
consorte.
O assim-chamado corno consorte, primo
do rei da Espanha e esposo de d. Maria Teresa, era uma pobre vítima do humor
brasileiro desde o casamento. D. Maria Teresa nunca tinha escondido de ninguém
sua queda pelos astros estrangeiros que visitavam o Brasil no carnaval e que
brilhavam nos cassinos cariocas. Seu novo alvo, diziam, seria Mel Gibson,
apesar de ela ser mais velha do que a mãe dele. Ninguém nunca provou nada, mas
que o Príncipe do Grão-Pará tinha a cara do Marcelo Mastroiani, tinha.
-- Festa?! Então por que que não
mandaram a gente pra
lá?
-- Porque não tem nada pra gente lá.
Além da Terezinha, do primeiro-ministro e do prefeito do Rio não tem mais
nenhum nobre por lá. Eles tão comemorando a chegada do novo embaixador
britânico, que nem sangue azul tem.
-- É ruim...Bem que a Lady Di podia
ter vindo junto...
Cetro riu: -- Se ela tivesse aqui, o
Joãozinho tava
colado nela.
Meses antes, a Folha Imperial tinha
lançado a nova
bomba: o príncipe estava a fim da
Lady Di. Eles tinham sido
vistos--e fotografados!--juntos numa
praia do Caribe. Ambos
vestidos, infelizmente. E
acompanhados por outras pessoas.
Mas isso não era importante; o
importante era que a idéia
estava lançada, a semente estava
plantada. A partir daquela
foto centenas de páginas da Folha
puderam ser preenchidas
durante meses. Graças à Folha não se
falava em outra coisa
no Império; as pessoas discutiam por
causa dos preparativos
imaginários do casamento, dos nomes
que teriam seus filhos
(se em português ou inglês), das
implicações constitucionais para ambas as monarquias (sendo ela princesa de
Gales e do Grão-Pará ao mesmo tempo), e até por causa da imaginária fusão do
Reino Unido ao Império do Brasil. E tudo isso por causa de uma foto! O poder da
Folha Imperial espantava até aos seus próprios autores.
E era de uma nova e poderosa bomba
como esta que a
Folha estava precisando. Barões
favelados não duram mais do
que duas manchetes. Era preciso algo
realmente grande, e de
preferência apresentado e
monopolizado por este jovem e leal súdito de Sua Majestade, Ronaldo Cetro.
Dida mirava sua teleobjetiva para o
pequeno
estacionamento ao lado do Paço
quando viu o portão ser
aberto. Ele virou pro Cetro e
perguntou:
-- Os funcionários do Paço não saem
às cinco?
-- Quando não tem nenhuma solenidade
à noite, sim.
-- É que tem uma loira saindo num
chevetinho podre. Só
pode ser funcionária.
-- Então é.
Cetro não estava muito interessado.
O chevetinho podre passou em frente
à barraquinha onde
eles estavam. O escapamento estava
detonado. Cetro então
olhou pro chevette e pra loira:
-- Nossa! Que coisa horrível! Parece
um travesti!
A loira acelerou fundo e, quando
chegou na esquina,
reduziu a marcha antes de fazer a
curva cantando os pneus.
Cetro deu um pulo: -- Putaquepariu!
Corre pro carro!
-- Que foi?
-- Corre pro carro, caralho!
Dida nem tinha fechado a porta do
passageiro quando
Cetro arrancou pra ir atrás do
chevette.
-- Tu tá achando que aquela loira é
ele?
-- É só um pressentimento...
-- Mas ele ia se arriscar saindo
assim, sem
guarda-costas nem nada?
-- Tu ouviu a reduzida que ela deu
antes de fazer a
curva?
-- Ouvi, e daí? Tu acha que mulher
não faz isso?
-- Não, não é isso. Acontece que
aquela não foi uma
reduzida comum; foi um
"taco".
-- Um o quê?
-- Taco. Punta-taco. Isso é coisa de
piloto. Antes de
fazer uma curva, todo piloto freia e
acelera ao mesmo tempo, com o mesmo pé, enquanto reduz a marcha. Se ele não der
essa acelerada na redução, o cambio estoura.
-- O meu nunca estourou...
-- Eu tô falando de pista, alta
velocidade, rotação
máxima, essas coisas; é claro que
isso não vai acontecer na
rua...
-- Pode parar, Cetro. Eu num tô
entendendo nada.
-- Tudo bem. Eu só tô te dizendo que
esse "taco" é um
vício de piloto. É isso. Tu acha que
o Paço tem alguma
funcionária pilota?
-- Bom, o Joãozinho é piloto, mas
isso não quer dizer
nada. Ele é um piloto de merda. Quer
dizer, ele nunca chegou aos pés do falecido Conde de Interlagos.
E nem o Ronaldo Cetro. O que não o
impedia de tentar.
Neste exato momento Cetro pilotava
pelas ruas da capital do
Império como se fosse o próprio
Conde fugindo de Schumacher
no circuito de Ímola. A esperança de
Dida era de que não
houvesse uma curva Tamburelo no seu
caminho.
Para alívio de Dida, a perseguição
não durou muito. O
chevetinho podre parou em frente à
casa noturna do
Sargentelli e os manobristas de
repente não sabiam o que
fazer com aquela poluição visual na
porta da casa. Eles
deram risada do carro antes que um
deles fosse falar com a
loira. Enquanto isso, Cetro parou do
outro lado da rua.
Dida e sua teleobjetiva voltaram a
ver a loira de
perto: -- A loira tá saindo do
carro...
-- Tu tá vendo ela direito?
-- Tô, mas...ela é um cara! Um cara
de boné!
-- Isso eu também tô vendo...Olha! O
manobrista se
curvou pro cara!
O drive da máquina fotográfica do
Dida estava rodando
sem parar; ele deve ter tirado mais
de vinte fotos de uma
vez. Cetro estava louco pela
confirmação:
-- E aí? É ele?
-- É, é o Joãozinho.
-- Nossa! Que demais, cara! Que
flagra!
A cabeça de Cetro estava a mil.
Todas as conclusões
naturais daquilo apareciam de uma
vez só: Sargentelli...
mulatas...sexo!...devassidão
imperial na primeira página!
Ele abriu a porta do carro, virou
pro Dida e disse:
-- Eu vou até lá. Continua
fotografando tudo. Se acontecer
alguma coisa comigo, fotografa tudo.
O porteiro da casa perguntou se ele
ia entrar e ele
disse que não, que estava apenas
esperando uma pessoa. Ele
sabia que o príncipe não ia demorar
muito porque os
manobristas tinham deixado o chevetinho
bem na porta, com
poluição visual e tudo.
Cetro chegou mais perto de um dos
manobristas: -- Tu
sabe de quem é esse carro? -- ele
perguntou, apontando pro
Chevette.
-- É de um amigo da casa. O carro
principal dele deve
tá quebrado.
-- Tu conhece ele?
-- Já falei: ele é amigo da casa.
-- Então ele vem sempre aqui...
-- Não muito...
Cetro tirou um documento do bolso e
mostrou pro
manobrista: -- Olha, eu sou repórter
da Folha Imperial e eu
tô sabendo que foi o príncipe que
chegou aqui neste carro.
Será que tu não poderia me dizer com
quem é que ele tá
saindo...
Ele olhou pro lado e disse: -- Eu
num sei de nada.
Cetro tirou os quarenta réis que ele
tinha no bolso e
ofereceu pro manobrista. Ele pegou e
disse:
-- Ele tá saindo com a Rosinete.
-- Só com essa?
-- É. Só com a Rosinete.
-- Quantos anos ela tem?
-- Dezoito -- ele disse e riu.
Cetro riu também: -- Já
entendi...Faz tempo?
-- Uns dois meses, acho.
-- Mas ele tava em Petrópolis!
-- Eu sei. Todas as meninas foram
fazer um show lá e
ele escolheu a Rosinete.
-- Ela é bonita?
-- A Rosinete é a mais bonita de
todas; é uma
princesinha.
Neste momento, o motorista do
Chevette, ainda usando um boné, saiu correndo em direção ao seu carro com uma
mulata ao lado. Cetro levantou a voz:
-- Vossa Alteza!
O príncipe parou e olhou pra ele: --
Pois não?
Cetro ficou surpreso com a sua
cordialidade. Ele estava até sorrindo!
-- Perdoe-me por esta intromissão,
Alteza, mas eu sou o repórter Ronaldo Cetro da Folha Imperial...
O príncipe estendeu a mão: -- Ah,
sim, muito prazer.
-- O prazer é todo meu, Alteza. Eu
só estava interessado em saber, em nome da Folha Imperial, quais são
os seus planos com relação a esta
jovem dama, dona Rosinete.
O príncipe deu uma gargalhada.
Obviamente ele não
esperava que este jovem e talentoso
repórter estivesse tão
bem informado. Cetro tinha
conseguido impressionar Sua
Alteza!
-- Posso lhe pedir um favor,
Ronaldo?
-- Sem dúvida. Será uma honra,
Alteza.
-- Não se deixe levar por
especulações sórdidas. Dona
Rosinete é uma moça séria e que
merece o maior respeito por
parte de todos os súditos do
Império. Se tudo suceder como
espero, eu farei um anúncio oficial
no momento oportuno.
Cetro ainda estava meio atordoado
pela cordialidade
imperial de d. João quando voltou
pro carro.
-- E aí? O que é que ele te disse?
-- o Dida perguntou.
-- "Muito prazer".
* * *
A redação da Folha Imperial nunca
tinha sido um lugar muito
especial para ele. Quer dizer, ela
não era aquele tipo de
lugar em que, logo quando você entra
nele, você sente que é
o lugar onde você quer passar o
resto da sua vida.
Bom, mas não era isso o que ele
estava sentindo hoje;
hoje a redação da Folha era o melhor
lugar do mundo. Cetro
entrou nela com o peito estufado e
com um dos exemplares da
Folha de hoje nas mãos. A manchete,
em letras garrafais,
dizia:
PLACAR IMPERIAL:
LADY DI 0 x 1 MULATA DO SARGENTO
E, logo abaixo, a foto tirada por
Dida. Cetro pôs o jornal
mais perto do seu rosto pra ver os
detalhes: a foto mostrava Sua Alteza o cumprimentando, com a Rosinete no
primeiro plano, prestes a entrar no carro. Graças à nova tecnologia, o
chevetinho podre já era; em seu lugar aparecia um Omega novinho. O mesmo tinha
acontecido com o boné que Sua Alteza usava naquela noite; ele tinha sido banido
da foto. De resto, era uma foto 100% autêntica. Sua legenda dizia:
"Ladeado por sua nova paixão, Sua Alteza Imperial cumprimenta Ronaldo
Cetro."
O artigo--na verdade uma narrativa
na primeira pessoa
por Ronaldo Cetro--descrevia tanto a
aventura daquela noite
como a nobre e incansável luta de
Sua Alteza em busca da
futura imperatriz e mãe de seu
herdeiro. Em respeito ao
pedido de seu novo amigo, o
príncipe, Cetro não exagerou no
detalhamento das atividades
profissionais de uma mulata do
Sargentelli. Ao mesmo tempo, ele não
afirmou--ao menos não
categoricamente--que ela era menor
de idade.
Ao chegar à sua mesa de trabalho,
Cetro encontrou uma
folha impressa em cima do seu
teclado. Preso à folha, havia
um bilhete que dizia: "busque
confirmação sobre isto". A
folha era um rascunho para o
editorial do dia seguinte,
escrito pelo editor, um velho
monarquista, fanático e
tradicionalista. Neste editorial em
particular, ele se
protegia muito mal de qualquer
futura alegação de
preconceito ao chamar Rosinete de
"jovem mestiça"...jovem
mestiça !
Bom, mas a alegação do velho era
outra; era sobre
velhas regras e tradições. Como ela
certamente era plebéia,
não havia possibilidade de casamento
e ponto final. O velho, por conveniência, tinha esquecido o fato de que na
monarquia brasileira títulos de nobreza eram distribuídos a granel. A
confirmação de que o velho precisava era a de que Rosinete não tinha nenhum
ancestral nobre. Isso ia ser fácil; alguns telefonemas iam resolver esse
assunto.
Mas a redação da Folha estava mais
do que agitada nesta manhã. Depois de ter ligado pra casa noturna do
Sargentelli, conseguido o telefone da Rosinete, ligado pra ela e ter sido
aconselhado por sua mãe a ligar para um certo advogado que esclareceria tudo,
Cetro parou tudo para receber a visita do dia, uma senadora do PTR, junto com
os seus deodoros.
Era incrível como os deodoros
adoravam essas visitas de provocação! E, dentre todos os deodoros, os do
Partido dos Trabalhadores Republicanos eram os mais radicais. Eles até achavam
que o Deodoro em pessoa, Deodoro da Fonseca, o
traidor dos traidores, condenado à
morte pela tentativa de
golpe contra d. Pedro II e anistiado
pelo mesmo--eles até
achavam que essa desprezível figura
histórica, origem do
apelido dos republicanos
brasileiros, devia ser homenageado
como herói. Que insolência!
Cetro não fez mais nada além de
levantar de sua cadeira enquanto os deodoros passavam; eles não mereciam mais
do que isso. Depois que eles entraram na sala do editor, Cetro voltou ao seu
telefone e ligou para o tal advogado de Rosinete para saber o quê, afinal de
contas, ele tinha a esclarecer.
* * *
A sala do editor estava lotada, mas
o Cetro entrou assim
mesmo. O que foi um alívio pro
velho, que já não estava mais aguentando aquela velha cantilena dos deodoros.
No meio de todos aqueles deodoros, ele deu um sorriso de orelha a orelha e
levantou a voz pra dizer pro editor:
-- Eu não consegui a confirmação
daquilo que o senhor
pediu. Pelo contrário, o advogado
dela me disse que tem um
processo de paternidade correndo na
justiça. A mãe dela é
solteira.
O velho não entendeu nada: -- E o
que é que isso tem a
ver com o fato de ela ser plebéia ou
não?
-- Segundo o advogado, o exame de
DNA vai provar que
ela é filha do Marquês de Santos.
O Marquês de Santos e atual ministro
extraordinário dos esportes no gabinete do Visconde de Higienópolis tinha
namorado várias mulheres, tanto
famosas como desconhecidas,
de misses a rainhas de baixinhos, e
por isso processos de
paternidade não eram surpresa em sua
vida. O negrão já tinha comido todas!
Antes de sair daquela sala infestada
de deodoros, Cetro virou pro velho editor monarquista, ergueu o punho direito,
e gritou:
-- A monarquia está salva! Viva o
Império!
Ao ouvir isso, o sangue do velho
ferveu. Ele se
levantou, ergueu o punho, e gritou:
-- Abaixo os deodoros! Viva o
Império do Brasil!
Bom, no final das contas esses
deodoros acabaram
colhendo o que plantaram. Onde já se
viu uma coisa dessas,
querer transformar o Império, com
todo esse agito saudável,
esse charme internacional e esse
alto astral, numa
republiqueta violenta e miserável
como tantas outras...
Esses deodoros são ridículos!
- Fim -